quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Uma história com princípio feliz

Cada um para seu lado.

E, então, o mar levou-os…

Olharam para trás uma última vez.

Partiram sabendo que nunca mais se veriam. Partiram com os rostos inundados de lágrimas sem fim, diluídas naquele mar que delas se alimentava, de corações desfeitos e corpos trémulos, possuídos por uma tristeza tão profunda quanto a alegria dos primeiros momentos. Sabiam que, naquele instante, parte deles tinha sucumbido, ferida de morte, e que não poderiam nunca mais voltar a ser quem tinham sido.

As ondas vieram, subitamente, como sempre fazem, sem se anunciarem, sem pedirem licença, sem contemplações, arrasando tudo aquilo que elas próprias tinham construído. Eles tentaram lutar, abraçaram-se com mais força, nadaram desesperadamente para se manterem à superfície, mas a força bruta das ondas, do vento, da corrente foi mais forte do que eles.

Por isso, eles nunca poderiam saber que a vida é, realmente, como o mar, sempre inconstante, sempre diferente e muito imprevisível. Embrenhados naquele abraço, tão sôfrego, tão reconfortante, esquecidos do tempo e de tudo, em permanente oração de Graças por aquela dádiva da vida e do acaso, não viram aquilo que todos os outros pressentiam. O mar da vida é cruel, muito cruel…

A vida corria-lhes bem, demasiado bem, diria quem os observasse de longe, sem estar envolvido, sem estar cego pela luz que deles emanava e que os aquecia, os alimentava, os sustentava.

Viveram como se a vida durasse um só dia, viveram freneticamente, intensamente, nada desperdiçando, nunca se separando, não se cansando de falar, de tocar, de beijar, de estar. Não, não se tratava de paixão, não se tratava de amor, tratava-se de um amor apaixonado, de uma mistura indescritível entre tudo aquilo que há de mais espontâneo, explosivo e fugaz nos afectos e aqueles sentimentos que duram toda uma vida, sem desgaste, sem fricção, sem fim.

Cresceram à sombra desse amor, qual adubo divino que os fez desabrochar para a vida, para a vida no seu sentido mais real, mais belo, mais perfeito. Sentiam-se em comunhão com tudo e com todos e nada os parecia afectar ou atingir. Eram felizes, eram um só e, sabiam-no, sempre assim seria.

Foram momentos típicos de uma história de amor, plenos de paixão, de olhares perdidos, de sorrisos sem razão, mas tão cheios dela, de beijos e carícias, de tudos e de nadas, de promessas e de planos, de saudade e de ansiedade, de vertigem e de miragem, de insónia e de suor, de… foram momentos maravilhosos.

Tinham-se conhecido por acaso. A vida é sempre assim, repleta de acasos, de tropeções, de actos fortuitos que nos empurram, que nos puxam, que nos deixam à deriva num mar demasiado vasto e poderoso para termos a ousadia de poder controlar. Por vezes quase nos afoga, a seguir resgata-nos e traz-nos à superfície, onde o Sol nos aquece e as ondas nos embalam para, depois, nos lançar nos mais violentos turbilhões que nos sugam até às profundezas gélidas e negras do mar da nossa vida. Alguém pensa que controla alguma coisa? Pura ilusão…

Ela sorriu e, com aquele sorriso, respondeu a tudo. Sem o querer, sem o saber, tinha-lhe aberto as portas para um novo mundo, sem retorno possível ao seu. Ele soube-o imediatamente e, mesmo assim, entrou. Tinha de entrar.

-Olá, como te chamas?

5 comentários:

Estudio Raposa disse...

Viva,
"Empurrado" por uma amiga tive o prazer de lhe o seu trabalho.
Gostaria de ler um ou dois textos seus no "Lugar aos Outros" do Estúdio Raposa.
Não sabe o que é?
Vá aqui, ouça e diga-me qualquer coisa.
http://www.estudioraposa.com
Cumprimentos
Luís Gaspar

DEANA BARROQUEIRO disse...

Caro Luís
Já não visita o seu blogue, para ver os comentários que lhe deixamos aqui? Nem voltou a presentear-nos com novos contos.
Gostaria tanto de os ouvir na voz espantosa de Luís Gaspar, no seu Lugar aos Outros, onde ele tem dado a conhecer a muita gente o talento de alguns que costumavam guardar tantos e tão belos textos na gaveta ou... numa Arca de Palavras.
Deixe que haja mais gente a conhecer os seus contos.
Um beijo desta sua admiradora e amiga
Deana Barroqueiro

Joaquim Alves disse...

É assim, parece-me desnecessário comentar pouco mais do que o que já fiz em "LUGAR AOS OUTROS".
Senti-me feliz por existir um LGA.
Aqui, desterrado e... recuperado pelo LG.
Um abraço do

joaquim alves

JOo disse...

Olá Sr. Luís Gouveia Andrade, sei que lhe pode parecer um pouco estranho, estar a receber uma mensagem de alguém que não conhece, e que lhe é completamente indiferente, para mim também é um bocado difícil, até mesmo embaraçoso, estar a escrever para alguém com tanto talento. Mas eu é que não poderia ficar indiferente a palavras tão bonitas, acredite que o Senhor é que é o mágico, pois, eu ao ouvir o Sr. Luís Gaspar ler as suas duas poesias, “Uma Noite” e “Uma História com principio feliz”, fiquei estranhamente maravilhado, estranhamente porque senti algo que nuca tinha sentido antes, fiquei um bocado estranho, admito que foi um sentimento muito inesperado, e isto tudo porque, não sou precisamente muito dotado para as leituras nem para a escrita, mas por alguma razão os meus ouvidos encheram-se de magia, magia que o senhor compôs no meu espírito, pois foi o senhor quem escreveu esses poemas tão sublimes, apesar do Sr. Luís Gaspar ter uma voz incrivelmente envolvente foi o senhor que lhe cedeu este resultado, e que em mim é fascinante. Sou um rapaz de 22 anos, que, volto a repetir, não tenho o hábito de ler (neste caso de escutar), coisa que me faz muita falta acredito, mas quando eu ouvi pela primeira vez, confesso, o Sr. Luís Gaspar narrar os seus poemas, parece que acordei para algo maravilhoso, sei que pode perecer um pouco exagerado mas foi assim que me senti. Não sei se é por ter muitas saudades da minha namorada, que está a estudar fora, ou se é por algum outro motivo, só sei que as palavras que o Sr. Luís Gouveia Andrade escreveu, em particular o poema “Uma história com principio feliz” e que foram lidas pelo Sr. Luís Gaspar, gotearam muito bem no meu ouvido e num momento bastante apropriado, confesso que não desejo mesmo nada, que me aconteça aquilo que acontece na historia do poema, pois estou a “crescer á sombra do amor” e diga-se de passagem que gosto de olhar “para a vida no seu sentido mais real, mais belo, mais perfeito” e assim quero estar, mas são coisas da vida. Contudo continue a ter com a escrita essa relação, que é muito boa por sinal e que não é nada conflituosa acredite, continue com esses impulsos e não os deixe nunca fugir. Hora se estes poemas são assim, os outros então… Vou lê-los. =) Um abraço deste mal habituado, que não tem mais nada para fazer. Continue, e muitas felicidades.

Vítor Costa Ramos


Qual quer coisinha:
JOo_Man18@hotmail.com

Joaquim Alves disse...

Sinto-me, agora, duas vezes feliz.
Por existir um texto assim,
a fazer feliz mais gente assado.
Como eu.